A rotina está bastante corrida. Aliás, muito corrida. Talvez por isso eu, quase sempre, tenho não pensado. Sem querer. Acordo atrasado, às vezes tomo uma xícara de café e como duas fatias de pão de forma integral com queijo. Saio correndo, muitas vezes sem tempo pro banho. Chego na faculdade com o desânimo típico de um veterano destruído de cansaço e preguiça, já que meu curso não é nem de perto aquilo que sonhava. Daí aparecem minhas alegrias: meus amigos. Falo merda. Xingo. Abraço. Fico louco na frente deles. Falo mal de tudo e de todos. E a única coisa que eles tem a dizer é: "Vamos, converse com a gente, o que você tem a dizer?" Às vezes não quero dizer nada, só quero ficar ali, com eles. Quieto, observando o que eles fazem, o que eles dizem. Pouco me importa o que pensam de mim. Aliás, importa sim, sempre tento melhorar pra continuar ao lado deles. Mas aí a realidade chama, o relógio acusa quarenta minutos de atraso, perco a chamada, vou pra aula, faço o check-in no Foursquare. Tento prestar atenção, mas tudo parece tão chato e vazio. Aula quase acabando, vou ver meus amigos de novo, rir de novo, esquecer o vazio, de novo. Por dez longos e deleitosos minutos.
Hora do almoço! Vão almoçar comigo? Não... ok, então. Daí chega a tarde, chega a noite, chega a hora de dormir. Tudo passa tão devagar e, mesmo assim, não tenho a mínima vontade de fazer o que deveria fazer: obrigações acadêmicas e obrigações pessoais. Minha agenda vai se transformar em um mausoléu de projeções e sonhos. E é assim que minha vida continua, dia após dia.
"Você desistiu dos seus sonhos?" Eu diria que não há um tempo atrás, quando ainda tinha aquele fogo de vontade dentro de mim. Não sei mais... Lidar com frustração requer um nível de maturidade que descobri não ter ainda. É claro que estou tentando e, entenda-se por frustração não só a frustração no amor, mas a frustração na família, nos estudos, no trabalho, pessoais. Eu, mais do que nunca, tenho tratado cada pequena desgraça da minha vida com uma ironia e um humor que ainda não consegui achar alguém que faça o mesmo ou que pelo menos torne isso visível. Mas estou começando a saturar. Aliás, acho que estou terminando de saturar.
"Puxa, que cara carente!" Nada a declarar, se carente estiver com um sentido pejorativo aqui. Porém, no sentido de necessidade, sim, sou carente. Como diria Raquel de Queiroz: "A gente nasce e morre só. E talvez por isso mesmo é que se precisa tanto de viver acompanhado."
O que está me mantendo, não diria intacto, mas forte o suficiente, são meus amigos. Mas e quando eles se afastarem e tudo for by my own? "Acharás outros amigos, não se preocupe." Não estou certo disso.
É bem certo que as pessoas vem e vão, assim como os amigos. E é bem certo que estou escrevendo esse texto todo cheio de melodramas pra chegar ao assunto central somente agora. Hoje eu pensei. Pensei e pensei e pensei e pensei. Não quero mais pensar. Cansei de tentar achar uma ordem, uma lei, uma regra, uma receita pros fenômenos da minha vida, cansei de Rubem Alves, cansei de platonismo, cansei. Não quero saber o porquê mais, só quero conseguir aceitar. Quero meu misticismo de volta. Cansei de ser racional, pois dói, ao contrário do que muita gente pensa. Ser racional me faz chorar, me faz querer entender coisas que só me fazem mal e, ao tentar entender, me sinto mais mal ainda. Foda-se a racionalidade. Quero acreditar em um novo deus, de preferência nos moldes pré-socráticos. Um não, em vários deuses. Quero me sentir rodeado de seres com poderes sobrenaturais que podem resolver cada uma das minhas frustrações separadamente. Porque eu mesmo não quero resolvê-las. Tomara que se explodam.
Hoje eu pensei, quebrando toda a normalidade da minha vida fútil. Agora sei que o normal só é um vidro fumê que tenta esconder toda a verdade, tudo o que há de inacabado dentro de cada um. Pensei, me frustrei. Pensei, pensei, para de pensar!
E eis que a pergunta demoníaca pulou, gritou, deu-me um soco com tudo no meio da minha racionalidade: POR QUÊ?! Não! Não vou responder! Não tenho que responder! Não sei responder! Não quero saber responder! Dói, não faz isso racionalismo desumano! Eu ainda não cresci pra suportar essa pergunta! Eu ainda não cresci. Forçaram meu crescimento, não fui eu, eu juro.
Apesar de tudo, amanhã a brincadeira recomeça. Hoje os brinquedos não estavam lá pra me manter ocupado, mas amanhã eles estarão. Não vou precisar pensar, que bom! Vou voltar a brincar de normalidade. Até que o dia 30 de abril chegue e eu tenha que pensar novamente, não porque quero, mas porque o racionalismo vai me jogar a obrigação da superação bem no meu colo. Vai me forçar a crescer. E crescer dói.
[O que a procrastinação não nos força a escrever, né?]